Estou em uma festa, rodeado de pessoas que me amam. Os pés seguros na terra, a cabeça ereta, sorriso nos lábios e esperança nos olhos. Tudo vai dar certo, penso, otimista. Conto das minhas coisas, conto de mim, e os ouvidos ao redor realmente ouvem; e se interessam, e opinam, e querem saber mais. Se preocupam, sem invadir; estimulam, sem iludir.
Num piscar de olhos, volto ao deserto. Sozinho. As mesmas pessoas que há pouco eu alimentava em festa, agora se ocupam demais em achar suas próprias gotas d´água. Eu sei onde há água, digo, otimista. Não me dão atenção. Não me ouvem. Acreditem em mim, eu sei que há água sob nossos pés. Não basta, estou sozinho, e sozinho não consigo cavar. Digo minhas coisas para mim mesmo, na esperança de que o vento as espalhe. Sofro, dói. Caminho engolido por minhas esperanças, perdido, sem bússolas ou estrelas. Perco o rumo, me perco, temo morrer e não cair, temo morrer e continuar andando. Por onde eu vou, pergunto. Por quê por aí? O vento me ouve, mas não escuta e nada me responde. Estou sozinho. Sozinho. Só. Quero afundar na areia. As pernas mal sentem o chão; estão bambas, tortas, a cabeça baixa, a coluna arqueada, os olhos fundos. Não me ouvem, não me apóiam, não acreditam em mim. Aos poucos, também deixo de acreditar. Aos poucos, deixo de me ouvir, depois deixo de falar, deixo de sentir, de pedir, de esperar. Gostaria que o deserto tivesse ao menos uma gruta, estreita e escura, onde eu pudesse me esconder. Mas grutas, não há. Não há nada. Não há ninguém. No deserto, só há a lembrança da festa, só há a lembrança da, só há a lembrança, só há a, só há, só.