sábado, 19 de fevereiro de 2011

Malhando a relação




Ontem uma amiga falava de suas frustrações com os homens atuais, dividindo-os em duas categorias: "os blasés e os cuzões."
Os blasés seriam aqueles que se acham a última bolacha do pacote, resumidamente, e que jogam a lei da oferta e da procura.
- Muita mulher disponível, posso esperar a noite inteira para escolher "a minha merecedora".
Os cuzões seriam aqueles que, teoricamente, querem achar uma fêmea, mas que ainda não sabem lidar com as mulheres modernas mais independentes e que tem medo de assumir compromissos e de se relacionar.

A questão é que, no fundo, acaba sendo tudo a mesma coisa. Os blasés são cuzões e os cuzões são blasés. (Desculpem o palavriado, mas não posso descaracterizar a classificação dela). O que acontece é que as pessoas estão perdendo a mão, estão desaprendendo a se relacionar.

Lembra do post que escrevi sobre escolher amar ou não amar. Pois é. Acontece que as pessoas escolhem amar, racionalmente, mas não fazem nada para colocar o tal amor em prática.
As pessoas escolhem investir num relacionamento com alguém. Mas o que elas fazem? Adicionam a pessoa no face. E basta! Como se isso já fosse o suficiente. Isso gera uma sensação errônea de posse, de garantia. Como se a carinha da menina no rol de amigos já fosse namoro (ou, no mínimo, sexo) garantido quando desse na telha. Eu sempre chamei isso de "teoria do potinho" - coloco a pessoa dentro de um pote e deixo lá, à disposição, para quando o bonito aqui decidir abrir para usar.

Sei que esse tema é batido, ponto comum, clichêzaço!! Não aguento mais falar do amor liquido, e tal, e coisa... Mas por quê ainda dói tanto nas pessoas?

Quando falei em escolher, racionalmente, amar, isso implica em uma série de atitudes e investimentos energéticos para fazer o amor dar certo. Não basta tomar a decisão, ligar a televisão, virar para o lado e dormir. Como se a decisão de amar alguém já fosse o próprio amor! Pois aviso aos navegantes: não é! Essa é uma atitude blasé!
Aquela velha máxima, chatíssima mas verdadeira, do "regar diariamente a plantinha"... Sabe? Pois é! Mas é isso mesmo, fazer o quê? Não tem como fugir disso. Dá trabalho mesmo! Amar é desgastante e queima calorias à beça! Como na malhação, o amor também funciona à base do "no pain, no gain"! A diferença é que a "pain" do amor, é uma delícia!!

Lembra antigamente, quando a mocinha era prometida para o mocinho e o mocinho para a mocinha? Que casavam sem nem se conhecerem direito? Que eram obrigados a permanecer casados, e assim, para não sofrer, aprendiam a amar um ao outro e, subitamente, viam-se "felizes" e satisfeitos com suas vidas amorosas? Quando os homens, para dar conta da poligamia genética da espécie, procuravam as prostitutas (que nada mais são do que os rostinhos da balada e do face de hoje, ou seja, possibilidades de relacionamentos sem compromisso), o que as mulheres, se pudessem, também fariam? Pois é. Estou achando que a fórmula para o casamento dar certo é muito parecida com essa, que sempre foi. Afinal, o casamento é um contrato social acima de tudo. Mas hoje em dia, ninguém mais é obrigado a isso (pelo menos não no mundo ocidentalizado). Ninguém mais precisaria procurar as prostitutas. Trata-se de uma escolha. Assim, hoje, dá para casar em liberdade! E manter casamento em liberdade, pelo livre arbítrio, é muito mais difícil, mas garantia de satisfação quando dá certo! Hoje, não precisamos mais da hipocrisia!

Portanto, a ginástica do amor não pode ser um esforço terrível! Não pode ser aquela aula de bike que você tanto odeia. Deve ser uma energia parecida com a que despendemos num hobbie sério, por exemplo. Deve ser aula de dança, não de aeróbica!
Sabe aquilo que você ama fazer, paralelamente ao seu emprego? E que para dar certo, exige um trabalho danado, mas que você faz sorrindo, com prazer, porque sabe que o resultado vai ser lindo e satisfatório? Pois é: construir uma relação deve ser assim.

Tem o lado ruim, cansativo, frustrante, os dias difíceis... É necessário abrir mão de muitas coisas, deixar-se de lado em alguns momentos (mas sem esquecer de te pegar de volta logo, logo!)... É um castelo de areia fina, frágil, porém lindo!

E essa "atitude amorosa" não pode ser unilateral. E isso está pegando hoje em dia. O individualismo excessivo, a "independência" excessiva, impede que as pessoas se deem ao trabalho de "perder tempo, energia ou dinheiro" num relacionamento. Elas se acomodaram! Afinal, basta ir para balada, ou entrar no facebook, para se deparar com a "enorme variedade de possibilidades" de novos e futuros relacionamentos! MENTIRA! E assim, se enganando desse jeito, as pessoas seguem sozinhas, cuzonas, reclamando e blasés.

Amar e sentir-se amado - tem coisa mais básica e batida do que isso?
Não dá para amar sem sentir-se amado (não estamos falando de amores incondicionais aqui, hein!)
E como fazer? Se estou cheio de amor para dar e não tenho quem receba? Ou melhor, quem saiba receber? Ou melhor ainda, quem saiba amar em troca?
Cuidado com essas perguntas, hein? Elas também soam blasés. Elas podem ser o avesso do individualismo que não ama!
Temos que baixar as expectativas. Afinal, nem sempre o que vem em troca vem do jeito que gostaríamos. O importante é que haja reação! Do tipo que for! O que não dá para aguentar é a apatia! Havendo reação, ótimo! Há vida amorosa aí! A qualidade desta reação, avalie somente depois de recebê-la! Esteja, acima de tudo, receptivo ao amor do outro. E não espere que seja igual ao seu!

PS.: Importante: às vezes isso soa como se o amor fosse algo racional!! A ESCOLHA DO AMAR OU NÃO PODE SER RACIONAL. MAS AMAR SÓ RACIONALMENTE, NÃO EXISTE!! Por isso, quando escrevo aqui do "investimento no amor", quero dizer, na relação. A presença de amor é condição basal! É capital inicial! E o investimento na relação, só faz esse amor inicial render mais e mais e mais! Entende?

E qual o reflexo disso tudo?

O ser humano não é bicho solitário, certo? É bicho de bando!
Então, já que esse excesso de liberdade e de independência está tornando o "relacionar-se" cada vez mais difícil, as pessoas estão voltando às premissas do passado. Ao casamento tradicional, careta e precoce - sim, as pessoas estão, novamente, casando-se muito jovens.

Mas o leite já está derramado. Essa "revolução contra-contra-cultura" leva os questionamentos dentro de si. Por mais tradicional que um casamento hoje tente ser, ele levará em si as ideias de liberdade, de independência, de sexo livre, de facebook, de quantidade de mais para qualidade de menos! A ideia de frescor, de transitoriedade, de lixo descartável, de que o velho e o mesmo não servem mais, dando lugar ao novo e ao inédito!

E isso tudo pode ser maravilhoso! Se um casal decidir se unir e estiver disposto a lidar com toda essa bagagem, a TRABALHAR DURO (mas com tesão!) para transformar o casamento em algo ainda mais sublime e verdadeiro, levando em conta as necessidades humanas e individuais, e este nosso cenário contemporâneo, em prol de um contrato de união real, fiel e delicioso de ser vivido, este casal pode construir um império!
Mas não basta decidir. Não basta saber o que deve ser feito! É necessário fazer! Juntos! O casamento é um projeto em sociedade! E se uma parte não faz, a que faz sozinha um dia se cansa e volta a procurar, lá fora, alguém que esteja tão disponível quanto ela para investir capital sentimental num relacionamento tão complexo (e tão fantástico) como um casamento! E aí surgem os amantes, as brigas de foice, as traições de diversos tipos, as disputas de poder... Enfim, o caos!

Numa sociedade, as disponibilidades para fazer a empresa dar certo devem ser equalizadas! Se um compra as velas, o outro compra o vinho! E assim o barco vai indo, tranquilo, deliciosamente caliente, generoso, cúmplice e companheiro!

É meus amigos, achar um partner é uma arte! Negociar as regras de um contrato é uma arte! E manter o contrato em vigor é também uma arte!

Humano+humano=obra de arte! Construtiva ou destrutiva! É tudo uma questão de escolha e de disponibilidade!

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Escolher o amor




Ouvi hoje de uma pessoa próxima e muito amada, que está em meio a uma crise amorosa, o seguinte chavão:

“... Mas nós não escolhemos gostar ou não de alguém!”

No momento da conversa, concordei, por puro impulso. E agora escrevo aqui para discordar.

Talvez exista (e sabemos que existe) uma diferença gigantesca entre os sexos masculino e feminino – quem disse a frase é do time das meninas - mas posso dizer de boca cheia que muitas vezes já escolhi gostar de alguém, e outras mais vezes ainda escolhi não gostar.

É óbvio que alguns impulsos são incontroláveis. Atração física, por exemplo, muitas vezes é oito ou oitenta.

Mas também já escolhi sentir atração física por alguém que, ok, já me atraia alguma coisa, mas não tanto. Queria ficar ao lado dessa pessoa e consegui colocar em evidência os pontos fortes, em detrimento de dar peso aos pontos fracos.
Obviamente, sejamos moderados. Há casos que não fazem milagre. Questões de pele, de cheiro e de textura que ou batem com nossos feromônios ou não. E ponto.

Mas voltando à questão. Sou testemunha de alma de que é possível sim, escolher gostar de alguém. E mais ainda: é possível trabalhar este gosto e chegar ao amor; e mais ainda, é possível antes disso, passar até pela paixão, aquela verdadeira e fulminante mesmo.

E assim como já escolhi gostar num começo de relacionamento, tive que escolher gostar algumas outras vezes, no meio dele. Momentos de crises, de fraquezas, de dúvidas, que me exigiram horas e horas de olhos fechados e de trabalhos de memórias, para poder chegar à conclusão que queria aquilo para mim, e por isso, escolheria gostar novamente. Amar novamente. E quando dava por mim, estava amando ainda mais forte e verdadeiramente. Aceitando os defeitos, respeitando os espaços, descobrindo novidades a cada dia em meio às toneladas de mesmices cotidianas, novos ângulos, novos detalhes antes despercebidos. Um jeito novo de beber água, mudanças no corpo e no toque, mudanças nos beijos... Eternas novidades em meio ao pretensiosamente “conhecido” amante. Pois diversas vezes, descobrimos que não conhecemos assim tão bem, e pensamos novamente se queremos gostar ou não daquele estranho que do dia para a noite aparece. Estranho sim, mas com a mesma essência de sempre.

E também mais freqüente ainda é a escolha de não gostar! Resistir às tentações que aparecem, futuros amantes em potencial por quem, se deixarmos, nos apaixonamos. Mas se não deixarmos, não.
A paixão é química? Sim. Mas a escolha em nos deixarmos nos apaixonar é nossa. Muitas vezes me peguei pensando e sonhando com as qualidades de alguém que andava me rodeando, e quando dava por mim, já estava na iminência de uma paixonite. Opa! Peralá! Se eu quero continuar amando e a cada dia mais apaixonado por quem tenho ao meu lado, minha escolha é “não, não vou me apaixonar por essa pessoa! Hora errada, momento errado. Sorry.” Deste modo, posso até estar perdendo na diversidade, mas a cada decisão desta, a cada força de vontade tomada, as recompensas na qualidade são gigantescas.

Há uma frase da peça “Closer”, que virou filme, que me marcou muito desde a primeira vez, e que me assombra desde então:

“Existe sempre aquele microssegundo de escolha entre o ir ou não ir; entre trair ou não trair.”

Sou humano, afinal, e lotado de defeitos. E é essa frase que faz com que eu lide com minhas culpas. Não digo aquelas católicas, mas aquelas ligadas ao livre arbítrio e a responsabilidade dos meus atos.

“Torna-te responsável por aquilo que tu cativas” – lembrei dessa dias desses.
E em meio a acertos e a erros, nunca tirei minhas responsabilidades da reta. Minhas responsabilidades de ir ou não ir. De passar a gostar ou de não deixar isso acontecer.

Somos humanos, sim. Mas no fim, na maioria das vezes, o cérebro esquerdo (aquele que é chato e racional) sempre decide. A palavra final é dele.

Li hoje mesmo uma reportagem sobre uma síndrome, em que após uma cirurgia de separação de hemisférios cerebrais (isso mesmo, cortam o corpo caloso, que é o que liga as duas metades do cérebro), começa a haver disputa entre as mãos direita e esquerda. Cada lado do cérebro quer uma coisa. Mas geralmente quem dá a palavra final é o esquerdo, e quando isso não acontece, a briga fica de igual para igual. Isso é patológico, ou seja, fora do eixo. O habitual, é que haja esta soberania da razão. Se não nos auto-boicotarmos, é claro.

Esquecer as emoções e os sentimentos?? JAMAIS!! Mas sermos senhores deles! Senhores absolutos –na medida do possível, pelo menos.

Assim, continuo escolhendo amar, escolho amar cada vez mais, e sei que a escolha apesar de racional, é totalmente coerente com meu coração. Pois ele ama por ações, enquanto meu cérebro amar por palavras.

E continuo escolhendo nem mesmo gostar, quando não quero distrações para meu amor.

E sei que isso pode parecer racional ou “papo-cabeça” demais para muitos, mas digo com a maior sinceridade: como é bom para a alma saber de tudo isso! Como é bom para a alma poder amar com qualidade! E como é raro poder encher a boca para dizer “eu te amo”, e como é precioso (talvez a maior de todas as preciosidades) sentir-se amado por amar, e só por isso!