quinta-feira, 24 de junho de 2010
Psiqueatro
Há duas semanas, voltei a trabalhar como Psiquiatra. Bem interessante essa volta, depois de quatro anos de pura negação e total mergulho na exclusividade da carreira artística.
Motivos para isso? São diversos; mas a oportunidade na hora certa, frente à necessidade de segurança financeira e ao desejo de ter uma rotina mais precisa de trabalho formaram um bom caldo para que eu tirasse o pó do jaleco branco. Alem disso, estava sentindo muita falta do contato com a vida alheia, que sempre me forneceu muito material para minhas criações artísticas.
A vida artística por si só estava muito chata, devo confessar. A convivência com artistas que orbitam seu próprio eixo e nada alem disso também estava me deixando muito frustrado. Meu tesão pela arte em geral estava broxa, e eu definitivamente estava precisando de uma boa pitada de realidade nua e crua no meu cotidiano.
O melhor de tudo é que a conciliação é perfeita! Tirando coincidências infelizes, na maior parte das atividades estarei por inteiro. A cabeça é que fica mais cansada, o corpo também, mas ambos estão sendo muito bem cuidados, obrigado.
Muito bem, então. Jalecos retirados do acervo de figurinos, um pouco de atualizações estudiosas, carimbo em punhos e ouvidos à obra.
Sabe o que me deixou mais contente? Sabe qual foi a grande mudança? Não precisei mais da cisão mental que me atormentava tanto antigamente. Não precisei me dividir mais entre o artista e o médico. Ambos se uniram, e estão apaixonados um pelo outro (regados de muita modéstia, claro).
Esses quatro anos de afastamento e negação foram fundamentais para que eu pudesse experimentar o outro lado da moeda, ou seja, o mergulho intenso no fazer artístico. Fundamental para sedimentar o ofício da arte na minha vida e na minha cabeça. Fundamental também para descobrir que isso não é lá muito saudável psiquicamente. Aliena. Emburrece um pouco. Todo artista precisa, com toda a certeza, de suas âncoras na realidade. Seja num negócio, numa atividade filantrópica, num estudo acadêmico, algo que o coloque em contato com a vida real e o lance contra sua atividade imaginativa. Acreditem em mim, colegas, os dois hemisférios cerebrais agradecem muito essa ação.
Minha única frustração (socialmente falando) e surpresa (artisticamente falando) foi perceber que 90% da clientela faz teatro. Sim, sim! Essa grande maioria de pessoas me procura para receber afastamento do trabalho. Um bando de preguiçosos querendo se aposentar pelo INSS com trinta anos de idade por “invalidez psíquica”, fazendo um teatro de primeira qualidade! Grandes atores no meu consultório de segunda a quarta-feira. Muito a aprender com eles!
Enfim, estava faltando meu lado real e encontrei. Não vai ser isso a vida toda, certamente (aliás, o que sabemos nós da vida toda?). Mas, por ora, essa atividade veio a calhar para meu equilíbrio cerebral. Coincidência ou não, desde que voltei a atender, muitos dos meus projetos artísticos que vagavam pelo espaço começaram a ganhar sua concretude!
E vamo que vamo! Psiquiator, ativar!
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