Um pequeno pedaço de berinjela ao alho se desequilibrou como ela e caiu na roupa que havia sido trazida da Itália. Óleo mancha.
Ela se levantou bruscamente olhando nos olhos dos que não a acompanhavam naquele jantar. Tremia um pouco, o ar completamente preso em seus pulmões já por segundos significativos. Segurava um grito que não podia soltar, não queria; não sem ter quem a ouvisse. Olhou ao redor. A letra do samba que há pouco a transportava ao seu passado, agora a trazia eternamente ao desiludido presente. A foto do filho cuja voz não mais conhecia no porta-retrato. Vontade de passar a mão no telefone e falar com ele, mas já não sabia mais de cor, o telefone. Agora eram muitos números, e a incerteza de que ele seria o primeiro a atender. Talvez viesse a outra, com quem não poderia gritar como gostaria. A comida fresca brilhava no prato. Havia alguns grãos de cuscuz no chão. Na dúvida entre limpar ou deixar que lá amanhecessem, sentou-se novamente. A respiração agora era ofegante, e a lágrima latente esforçava-se para deixar o olho esquerdo. Não iria chorar. Não queria; não sem ter quem a visse. Bebe um gole do vinho rosado que agora lhe descia mais ácido que o vinagre em que se transformaria. Sente náuseas e a vontade de se regurgitar por inteiro. Puxa o ar, que se recusa a entrar. Tenta novamente. A guerra contra a lágrima mostra sinais de derrota. Respira mais uma vez, sem sucesso. A foto do filho. Os olhos dele, que não lembravam os dela. A mancha na roupa nova, que vestiu hoje pela primeira vez para jantar em sua própria companhia. A roupa que ninguém havia elogiado, porque ninguém havia visto. A garganta fechada, a pontada no peito, a náusea, a lágrima. O chão sujo sob seus pés recém feitos no salão. Óleo mancha. O maldito ar que não passa.
Levanta-se impetuosamente e com a faca ainda marcada pela comida por ela preparada, rompe a fronteira do pescoço para que o ar enfim entre e para que o grito saia. E assim se passa. Escorrem todos: a roupa manchada, a faca e a lágrima.
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